Uma nuvem e o meu cão
Reina sobre o céu azul da minha alegria
Uma nuvem cinzenta e ciumenta
Uma forma singular que me atormenta
Que me disputa e predispõe a pensar
No azul deste dia solarengo a circular
Entre a madrugada e o ocaso
E é o caso
Que da minha casa vejo da varanda
O horizonte largo, de uma cidade inteira a cirandar.
Fico-me estático a contemplar
Isso tudo, apesar.
Do horizonte vasto
Toldado apenas por uma nuvem cinzenta e ciumenta
Por uma forma singular que me atormenta
Que me disputa e predispõe a pensar.
Estou triste, estou contente
Estou aqui, ou ausente?
Não sei! Mas subitamente
O meu cão
Que aparentemente dormia
E eu vejo de través
Junto aos meus pés
Sai da inanição
Salta da modorra e a ladrar faz-se presente
Como se fora marinheiro urgente
A acordar de repente
Para amarrar gurupés
Na eminência de tufão
Claro que não há tufão à vista.
O céu está vibrante e a visibilidade é nil
Espraia-se-me a vista num céu azul de anil.
Mas como dizia, o cão
Salta da modorra sobre a minha cogitação
Na varanda
Onde me julgava sozinho a observar
A cidade inteira que ciranda
Num horizonte vasto, apenas toldado
Por uma pequena nuvem cinzenta e ciumenta
Por uma forma singular que me atormenta.
Mas aqui mesmo a meu lado
Que maravilha excelente
Que instintivo animal
Ao ver-me estático assim
Salta subitamente sobre mim
Como se fora uma fera colossal
Pronta a filar-me a garganta
Mas afinal
O felino salto acaba num sem jeito
De latidos sonoros e patas dianteiras
Arremessadas sobre o meu peito
Que me fazem perder o equilíbrio e a concentração
Distraindo-me da atenção
Que detenho sobre a cidade
Num horizonte toldado
Por uma nuvem cinzenta e ciumenta
Por uma forma singular que me atormenta.
Mas o meu cão não se importa
Com o que eu possa pensar
Ladra e lambe durante um bocado.
Eu retribuo fazendo-lhe festas no costado
Enquanto ele abana a cauda (sinal de brincadeira).
E assim ficamos desta maneira
Por um minuto
Eu a fazer-lhe festas no pelo hirsuto
Ele a lamber-me contente.
Depois, subitamente
Deixa-se cair p’ro o chão
De forma displicente
Esgueira as patas pousa o focinho
Enrola-se aos meus pés como se recolhesse a um ninho
Esboça um bocejo, aspira a tarde fria
Esquiva-se encolhe-se
E como se fosse omnisciente
Esvai-se novamente
Não sem antes projectar fugaz e ausente
As sua íris castanhas
Na amplitude do universo e na fronteira de montanhas
Que demarcam lá longe o horizonte
E é então que regressa sabiamente
À modorra interrompida.
É nessa altura que dou conta de mim
Nesse preciso momento quando subitamente
Um cheiro de jasmim
(planta que tenho na varanda)
Me retira da anterior contemplação
Dessa nuvem cinzenta e ciumenta
Forma singular que atormenta
O azul da minha alegria sobre a cidade
Que ciranda se desmanda e sarabanda em ansiedade
É então nesse preciso segundo
Que reparo que o meu cão
Pouco se importa com o mundo,
Ou com a minha cogitação
E ressona aos meus pés em sono profundo
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