Thursday, November 6, 2008

Sun Yat Sen. Outra grande figura que passou por Macau


Sun Yat-Sen nasceu a 12 de Novembro de 1866, numa aldeia rural, 30 Km a norte de Macau, distrito de Xiang Shan (actual município de Zhong Shan) - berço de inúmeros chineses ultramarinos, que procuraram o seu sustento fora da terra. Também o pai de Sun emigrou para Macau, onde trabalhou como sapateiro numa oficina no local em frente à actual Livraria Portuguesa. De regresso à aldeia, onde foi guarda, arrendou umas terras e delas cuidou, como agricultor. Sun, criança pobre com 5 irmãos, ajudava o avô na apanha de ostras, e o pai nas lides da lavoura. "Sou cule e filho de cules", declararia mais tarde, recordando a China semi-colonial e semi-feudal da sua infância.Aos 12 anos passou por Macau, pela primeira vez, acompanhado da mãe, rumo ao Havai, onde o irmão mais velho, Sun Mei, ali residente, lhe custearia os estudos. Assim iniciou uma educação ocidental que concluiria com a formatura em medicina pelo Medical College de Hong Kong, em 1892. Começou nesse ano a sua carreira de médico em Macau, no hospital de Kiang Wu, tornando-se o primeiro médico chinês a praticar ali medicina ocidental. Impedido de prosseguir a sua carreira em Macau, onde já iniciara preparativos para uma insurreição contra o poder manchu, mudou-se para Cantão. Na sequência de uma tentativa abortada, fugiu para Macau e, com a ajuda de um amigo macaense, Francisco Hermenegildo Fernandes, embarcou para Hong Kong e dali para o Japão, principiando uma carreira de revolucionário profissional, com deslocações à Inglaterra e aos Estados Unidos. Em Tóquio tornou-se, em 1905, presidente de uma liga republicana que adquiriu rapidamente importância na China e que esteve directamente ligada à revolução que em 1911 derrubou a dinastia Qing. Tornou-se deste modo no primeiro Presidente Provisório da República da China, e tomou posse do cargo, com um governo também provisório, em Nanquim, a 1 de Janeiro de 1912. A revolução abortou de imediato e foi forçado a demitir-se, logo em 13 de Fevereiro seguinte, um dia depois da abdicação do imperador manchu. Quando a China voltava a mergulhar na anarquia, Sun Yat-Sen passou por Macau, onde não voltara desde que aqui fizera escala, em fuga para o exílio, em 1895. Desta vez vinha em trânsito de Hong Kong para Cui Heng, sua terra natal. Chegou a 24 de Maio, e permaneceu três dias, alojando-se no palacete de Lou Lim Ioc, seu apoiante e amigo. Encontrou-se com o governador e com outras personalidades que lhe organizaram uma recepção solene, e visitou o hospital de Kiang Wu. Voltaria a passar por Macau, vindo de Xangai, em 16 de Junho do ano seguinte, ficando então instalado em casa do irmão mais velho, Sun Mei, na Rua Central, e seguindo para Hong Kong a 24. Nesta visita, realizou encontros com o objectivo de acelerar a proclamação da independência da província de Guangdong (viria a ser empossado como Excelso Presidente de Cantão) e aproveitou para se encontrar com a sua filha mais velha, gravemente doente.( A jovem Sun Ting, que havia partido para os Estados Unidos no ano anterior, para estudar, com os dois irmãos Sun Fo e Sun Wan, regressara entretanto a Macau por sofrer de doença renal grave, da qual viria a falecer a 25 do mesmo mês, um dia depois da partida do pai para Hong Kong). Sun Yat-Sen não voltaria a Macau, cidade que continuaria a ser uma importante base para as actividades dos seus correligionários. Morreu de cancro no fígado, em 12.3.1925, sem assistir à vitória do Kuomintang, partido nacionalista e republicano que entretanto fundara, e sem ver a unidade e a dignidade do povo chinês que seriam restabelecidas só em 1949, com a vitória dos comunistas sobre o Kuomintang e com a constituição da China Popular, um século depois da guerra do ópio.
Sun Yat-Sen deixou dois testamentos: um dirigido aos seus correligionários do partido (a última e veemente recomendação referia-se à abolição dos tratados iníquos, incluindo, naturalmente, o Tratado de Pequim, de 1887) e outro dispondo dos seus bens (O que eu deixo são livros, roupas e a minha casa, indo tudo para minha mulher como recordação). Em instruções à esposa terá manifestado a vontade de ser embalsamado, colocado numa urna semelhante à do seu amigo Lenine, que falecera um ano antes, e enterrado no Monte do Tigre, em Nanquim. Quando da sua morte, foi expedido um telegrama para Moscovo, a ordenar o envio da urna. The Time escreveu, sob o título Catástrofe Brilhante, que era uma pena que a vida romântica de Sun tivesse dado nos seus últimos anos na lamentável catástrofe do bolchevismo.A partir do ano da morte de Sun Yat-Sen, Chiang Kai Shek (casado com uma irmã da terceira mulher de Sun), comandou o Kuomintang na luta contra o comunismo, que antes fora a ala esquerda do seu partido. E seria o partido nacionalista a perder a contenda. Aos seus apoiantes restou-lhes o refúgio em Taiwan. Hoje, apesar das divergências ideológicas e das constantes quezílias, uns e outros respeitam e celebram a memória do Dr. Sun Yat-Sen.Alguns dias após a morte deste, realizou–se no hospital Kiang Wu uma grandiosa homenagem em sua memória, na qual terão participado cerca de 20.000 pessoas, das 100.000 que então habitavam nesta cidade.Macau era a terra adoptiva da família do Dr. Sun. O irmão mais velho, Sun Mei, a primeira mulher, Lu Mou Cheng, e os três filhos aqui viveram e alguns aqui faleceram, factos que afirmam o apreço que o fundador da república chinesa nutria por esta terra, apesar das tensões e dos sentimentos contraditórios que por ela alimentou. Nacionalista convicto, rejeitava liminarmente o poder estrangeiro sobre qualquer parte da China, incluindo Macau, embora se tivesse normalmente servido da colónia para ganhar a vida, para escapar à morte e para proteger a família. As suas relações com a administração portuguesa atingiram momentos de alguma tensão, particularmente em 1922. Em 28 e 29 de Maio, ocorreram aqui factos graves contra a soberania portuguesa, contra o prestígio das autoridades e a segurança dos residentes, e Sun Yat-Sen, com a população chinesa a abandonar o território, atribuiu à administração de Macau a responsabilidade pelos distúrbios. Procedendo assim, Sun-Yat-Sen revela a mais negra ingratidão (…) e hoje Macau experimenta, como todos os benfeitores de Sun-Yat-Sen, o valor moral deste acrobata político, escreveu Monsieur A. Vandelet em L' Echo de Chine, de Xangai, citado por Mons. Teixeira. Ainda na sequência dos mesmos acontecimentos, o Liberal de 30.7.1922, descreve-o como o mais encarniçado inimigo que Portugal possui nestas regiões, e o indivíduo que orientou, provocou e tornou possível o acto sedicioso de 29 de Maio. Dar-lhe guarida em Macau seria pactuar com o tiranete que mais nos tem afrontado!!! Foi mais uma fase complicada da complicada história desta terra que conheceu sempre dois poderes. Só a firmeza da resposta do governador, Comandante Corrêa da Silva-Paço d‘Arcos, terá evitado crise maior. O Dr. Rodrigo José Rodrigues, governador que se seguiu, tentou uma aproximação: Macau era a cidade onde o dr. Sun tinha o seu lar e a sua primeira mulher. Seria sempre o seu asilo seguro. Mais: - eu e ele éramos dois democratas e ambos médicos. Devíamos entender-nos. E entendemos, escreveu mais tarde no República de 24.9.1952.

Testemunho perene da ligação de Sun Yat-Sen a Macau, são três grandes estátuas, um busto, e uma Casa-Museu: Sun Yat-Sen Memorial Hall. A nenhum herói Macau havia erigido tanto mármore e tanto bronze. Sobre as origens da mansão evocativa, Abílio Basto, em Julho de 1968 explicava no Clarim, que o Governo Nacionalista da presidência do Dr. Sun-Yat-Sen, que tinha a sua sede em Cantão e o governo de facto e não de jure do sul da China, por conseguinte não reconhecido pelas potências estrangeiras, pretendia, a todo o custo, ter aqui uma propriedade para fins políticos . E teve. O Dr. Sun tinha no local onde hoje se ergue a Sun Yat-Sen Memorial Hall, na rua de Silva Mendes, uma pequena casa de estilo ocidental, que era a sua residência em Macau, mas onde nunca chegou a habitar. (Não se conhece qualquer deslocação de Sun Yat-Sen a Macau, depois de Junho de 1913, apesar de a Casa-Museu distribuir aos visitantes uma informação em chinês e inglês, onde se escreve que after the 1911 revolution and the establishment of the Republic of China in 1912, Dr. Sun in 1918 had a small western-style house built at Lung Tin Village - now Rua de Silva Mendes - as his house residence. He used this house from time-to-time until his death). Esta casa foi efectivamente construída em 1918, sete anos antes da sua morte, pelo filho Sun Fo, com dinheiros de Sun Mei, o irmão mais velho que lhe havia custeado os estudos, e que entretanto havia falecido, em 1915. Em Agosto de 1968, Luís Gonzaga Gomes recordaria que em frente do Quartel de Artilharia, onde actualmente se encontra instalado o Comissariado da Polícia de Segurança Pública, existia uma casa, bordejando a actual Rua Silva Mendes, que servira de habitação à mulher do Dr. Sun-Yat-Sin, tendo sido destruída no pavoroso desastre da explosão do paiol da Flora, em 1928 (sic), erguendo-se em seu lugar, um edifício de estilo mourisco-modernista, sendo nessa casa que Sun-Fo, filho do Dr. Sun-Yat-Sin, costumava alojar-se quando de passagem por Macau. A explosão do Paiol Novo da Flora, em 11.8.1931, que destruiu várias casas num raio de 500 metros, danificou severamente a casa de Sun Yat-Sen. O Conselho do Governo destinou então uma verba significativa para fazer face aos prejuizos daquela e doutras casas. Com o dinheiro que recebeu e com um empréstimo que contraiu, o filho de Sun, Sun Fo, que então era Administrador Civil da Província de Cantão (e que viria a ser Primeiro Ministro de Taiwan), encarregou-se de mandar reconstruir a casa, em 1933. É um edifício diferente do original, mas de estilo arquitectónico ocidental (mourisco-modernista, na apreciação de Gonzaga Gomes), como a primitiva residência. Sun Yat-Sen falecera 8 anos antes da construção desta segunda casa, onde viveu a mãe do proprietário, e primeira esposa de Sun, Lu Mou Cheng, falecida em Macau, em 7.9.1952. Embora fosse habitada, esta mansão tinha outras utilizações, algumas de carácter político. Para isso dispõe de três pisos com cinco divisões cada. Em Abril de 1958, os nacionalistas do Kuomitang aqui refugiados transformaram-na em Casa-Museu. Em Junho do mesmo ano, o proprietário, Dr. Sun Fo, por intermédio do seu procurador, Dr. Adolfo Jorge, vendeu-a a um funcionário chinês residente em Taiwan, Tong Sai Fong. Passou assim a ser propriedade do governo nacionalista de Taiwan. É o único local do Território onde os activistas anticomunistas do Kuomintang e simpatizantes locais realizam pequenas manifestações simbólicas, desde que a sua actividade pública foi proibida pelas autoridades portuguesas, no rescaldo dos motins maoistas que aqui ocorreram em 1966/67. Então foi proibido até o hasteamento e o uso de sinais alusivos a organismos ou bandeiras estrangeiros que pudessem ser considerados hostis à República Popular da China. (Boletim Oficial nº1, de 7 de Janeiro de 1967)No rés-do-chão desta mansão, à direita, encontra-se um elegante busto do fundador da República da China, em bronze, e, no jardim, ergue-se uma estátua, também em bronze. Esta havia sido oferecida pelos japoneses à aldeia natal de Sun Yat-Sen, e foi de lá trazida para Macau, durante a Guerra do Pacífico, para ficar protegida de quaisquer ataques. Por cá ficou. Obra dum proeminente escultor japonês, ergue-se sobre um pedestal de mármore preto espelhado, em forma de prisma rectangular, sem qualquer inscrição.Uma outra estátua em bronze, encontra-se no hospital Kiang-Wu, à entrada, no recinto exterior ajardinado. Enorme, em corpo inteiro, representando o Dr. Sun com bata e estetoscópio, ergue-se sobre um círculo relvado, tendo na frente um livro, também em bronze, com inscrições em chinês, elogiando o homenageado. Numa placa em mármore, também de grandes dimensões, colocada atrás da estátua, refere-se, em língua chinesa, a difícil situação do Império do Meio nos últimos anos da dinastia Qing e a transformação revolucionária operada por Sun Yat-Sen. Alude-se também ao trabalho que realizou naquele hospital, informando que a estátua se destina a recordar o bom relacionamento que manteve com aquela instituição. Esculpida por um ilustre professor da Faculdade de Artes da Universidade de Cantão, cujo nome não é referido, esta estátua foi inaugurada em 12.3.1986, na comemoração do 120º aniversário do seu nascimento e 61º aniversário da sua morte. Na altura em que foi inaugurada era a única estátua de Sun Yat-Sen, em todo o território chinês, em que ele era representado como médico. A estátua mais recente do fundador da República, ergue-se perto das Portas do Cerco, à entrada do Parque que tem o seu nome, desde Novembro de 1990. Foi então que o Leal Senado de Macau deliberou designar de Parque do Dr. Sun Yat-Sen, o que acabava de ser construído junto ao Canal dos Patos. Com 2.8 metros de altura e 1.3 toneladas de peso, a estátua, da autoria de dois escultores de Cantão, foi oferecida a Macau pelo Instituto Zhong Shan, de Pequim, cujo vice-presidente se deslocou aqui, para assistir à inauguração, acompanhado de uma delegação de artistas e historiadores. Comemorava-se naquela data o 124º aniversário do nascimento do herói nacionalista chinês. Sobre uma base cilíndrica, de mármore espelhado, tem os seguintes dizeres, em chinês e português: Comemoração do 124º aniversário natalício / Oferta do Instituto Zhong Shan de Beijing / Erigido pelo Leal Senado de Macau / 12 de Novembro de 1990

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